Marco Weissheimer
O Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul (IPE-RS) vive uma situação paradoxal. De um lado, apresenta expressivos números de segurados (quase um milhão no IPE Saúde e mais de 300 mil no IPE Previdência, entre ativos, inativos e pensionistas), é hoje um dos planos de saúde com maior índice de informatização do país e, juntamente com o Sistema Único de Saúde (SUS) é o único plano de saúde que cobre a realização de transplantes. De outro, enfrenta graves problemas de financiamento que prejudicam o atendimento dos segurados, provocam o descredenciamento de médicos e colocam em xeque o futuro da instituição criada no dia 8 de agosto de 1931, por meio do Decreto nº 4.842, pelo então interventor federal general José Antônio Flores da Cunha.
A crise econômica vivida pelo IPE foi tema da audiência pública realizada no início da noite desta segunda-feira (17), na Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa gaúcha. Os diretores de Saúde e de Previdência do instituto, Antônio de Pádua Vargas Alves e Ari Lovera, respectivamente, apresentaram na audiência, proposta pela deputada Manuela D’Ávila (PCdoB) e presidida pela deputada Miriam Marroni (PT), alguns dos principais números que definem hoje o universo coberto pelos serviços do IPE. Esse universo, destacou Antônio de Pádua, na área do atendimento à saúde, abrange quase 10% de toda a população do Rio Grande do Sul. Ao todo, são 985.217 beneficiários do plano de saúde da instituição, entre segurados e dependentes, mais de 7 mil médicos credenciados, e mais de 15 milhões de atendimentos efetuados somente no ano de 2014.
Na área da Previdência, relatou Ari Lovera, são 282.122 segurados no Regime Próprio e 45.835 pensionistas. Entre os pensionistas, 31 têm mais de 100 anos, sendo que um deles completou 115 anos, recentemente. A alíquota de contribuição é de 13,25% desde abril de 2013.
Em 2013, o Tribunal de Contas do Estado realizou uma inspeção extraordinária para analisar a situação do IPE Saúde. A partir da análise dos números da instituição, os auditores do TCE estabeleceram dois cenários. No primeiro deles, se receitas e despesas crescerem na mesma média verificada nos últimos nove anos, o déficit chegaria a R$ 98,7 milhões em 2014 e a R$ 879 milhões em 2023. Este cenário considera as contribuições dos segurados e do governo nos níveis atuais e o perfil atual dos gastos com assistência médica. No segundo cenário, o déficit fecharia 2014 em R$ 117,2 milhões e chegaria a R$ 1,3 bilhão em 2023. Segundo a inspeção do TCE, desde 2004, as despesas do IPE Saúde aumentaram 104%, enquanto as receitas subiram apenas 40%. O relatório do Tribunal de Contas aponta ainda falhas na gestão do órgão, insuficiência no número de servidores e negligência na cobrança de devedores.
Carlos Dorneles, representante do TCE, disse na audiência pública que o conselheiro Estilac Xavier solicitou alguns esclarecimentos sobre essa inspeção e, no momento, está sendo realizada uma auditoria no instituto para apontar com mais detalhes problemas como o déficit de funcionários e o déficit econômico provocado pelos atrasos de pagamentos de devedores.
“Há cidades, onde a única coisa presente do IPE é a cobrança”
Helenir Aguiar Schürer, presidente do Centro de Professores do Estado do Rio Grande do Sul (CPERS), fez um relato das dificuldades enfrentadas pela categoria para ter acesso aos serviços do IPE. “No início da nossa gestão, procuramos a direção do instituto e apresentamos um dossiê sobre os problemas de atendimento enfrentados pelos professores, especialmente em cidades do interior do Estado. Há municípios, onde a única coisa presente do IPE é a cobrança. A dificuldade em conseguir consultas é muito grande. Nestes municípios, há casos de médicos que solicitam uma pequena ajuda, que pode variar entre 90 e 150 reais, e há muitos casos de descredenciamento”, disse Helenir. A presidente do CPERS manifestou preocupação sobre como ficará esse quadro com o ingresso de novos segurados e com a possibilidade dos servidores começarem a ter que pagar pela internação hospitalar.
“Fomos surpreendidos com as notícias sobre um aumento da contribuição do IPE que hoje, em muitos casos, é quase uma doação”, acrescentou a sindicalista, que chamou a atenção para o fato de que os salários mais altos do Estado não estão mais contribuindo para o IPE Saúde, mas sim para um plano de saúde privado. “Diante deste cenário”, anunciou, “o CPERS irá para a rua para defender um IPE público, de qualidade e com atendimento, de preferência”.
Sérgio Arnoud, presidente da Federação Sindical dos Servidores Públicos do Estado (Fessergs), definiu como muito delicado o momento vivido pelo IPE e lamentou a ausência do presidente do instituto na audiência pública. “Temos aqui dois diretores classistas, que não têm poder de decisão e que terão que ouvir as críticas no lugar de quem tem poder de decidir”. Entre os principais problemas vividos pelo IPE, Arnoud destacou o fim adesão compulsória. “Os altos salários e os servidores mais jovens não vão para o IPE. A faixa etária média dos segurados do IPE Saúde varia entre 50 e 70 anos hoje. Esse é o principal fator de desequilíbrio vivido pela instituição”. Além disso, apontou o alto índice de inadimplência de prefeituras, de órgãos públicos e de outros poderes que não pagam a parte patronal dos pensionistas, o que acaba sendo feito pelo instituto.
O presidente do Fessergs identificou ainda o desenvolvimento tecnológico da medicina que deu origem a exames altamente sofisticados e caros que o IPE tem que pagar. Além do pagamento de transplantes, que hoje estão na casa dos 100 mil reais cada. “O instituto tem carência de funcionários, não possui número de médicos auditores suficiente para auditar as contas e os médicos protestam que há três anos as tabelas de procedimentos não são corrigidas”, acrescentou. Para enfrentar esse quadro, entre outras medidas, Arnoud defendeu uma alteração na legislação para deter a evasão de servidores para outros institutos na sua juventude e seu retorno na velhice quando os planos se tornam caros.
Sul21