Aumento do ICMS e dos saques aos depósitos judiciais estão na mira
Não foi um ato isolado a decisão do governo José Ivo Sartori de parcelar salários do mês de julho dos servidores estaduais. Com o agravamento da crise, o expediente deverá ser retomado no momento de pagar os vencimentos de agosto e, possivelmente, de setembro. Duas medidas que injetariam dinheiro no caixa do Estado em curto prazo, garantindo o pagamento integral da folha, ainda precisam de tempo para serem colocadas em prática. Até lá, a rotina dramática de atraso para trabalhadores ativos, inativos e pensionistas vinculados ao Executivo deverá se manter.
Neste mês, até o dia 25, o Palácio Piratini pagará a última das três parcelas do salário de julho. Seis dias depois de findado o escalonamento anunciado na última sexta-feira, estará na hora de honrar uma nova folha integral, no valor de R$ 1,1 bilhão. Mais uma vez faltará dinheiro, com a manutenção do uso de recursos do presente para quitar despesas vencidas no mês anterior.
Nos bastidores, governistas admitem que o eventual parcelamento do salário de agosto, a ser pago em setembro, poderá ter faixa de corte ainda menor do que os R$ 2.150 do primeiro pagamento referente a julho. Na sexta-feira, em entrevista coletiva, o secretário da Fazenda, Giovani Feltes, afirmou que “as dificuldades se avolumam e devem piorar”.
O Piratini trabalha com duas alternativas para amealhar recursos ao caixa de forma imediata, algo que possa interromper a rotina de atraso de salários que se avizinha. A mais impactante é a ampliação do limite de saques da conta dos depósitos judiciais, onde ficam resguardados os valores empenhados por partes litigantes em processos. A ideia é ampliar o teto de retiradas de valores dos atuais 85% para 95% do montante. Isso permitiria ao governo Sartori tomar mais R$ 1 bilhão. Considerando que em julho faltaram R$ 360 milhões para quitar integralmente a folha, o acréscimo de R$ 1 bilhão cobriria o rombo de praticamente três meses de salários.
O problema é que essa medida precisa ser analisada na Assembleia, via projeto de lei. É considerada uma proposta de fácil aprovação e, pela estratégia do governo, as iniciativas mais difíceis de serem aceitas pelos parlamentares, como o aumento de ICMS, serão enviadas primeiro. Dessa forma, a ampliação dos saques dos depósitos judiciais deve chegar ao Legislativo na segunda quinzena de agosto, em regime de urgência, que força a votação em 30 dias. Isso indica que, na melhor das hipóteses, o governo somente poderá se apropriar desses recursos no final de setembro.
Vídeo: Entenda como o Estado chegou ao limite
A segunda opção é a antecipação de receitas do Fomentar, programa de incentivos fiscais a empreendimentos. O Piratini pretende abrir uma negociação com a General Motors (GM). Pelo acordo com o Estado pelo Fomentar, a montadora de automóveis tem débitos futuros a pagar, com vencimentos próximos de 2030. A ideia é negociar com a GM para que o pagamento desses títulos seja antecipado, se beneficiando com a oferta de algum deságio. Se a GM não demonstrar interesse ou adquirir somente parte dos papéis, o governo os colocará no mercado. É uma ação que deverá ocorrer, trazendo recursos ao caixa, somente entre setembro e outubro. A expectativa é de que a operação – também realizada no governo Tarso Genro para antecipar receitas – gere cerca de R$ 300 milhões.
Impactos econômicos
Para economistas, sem ajuda consistente do governo federal, o parcelamento dos salários dos servidores estaduais deve ser uma realidade daqui para frente, já que o Piratini está com as fontes de recursos praticamente secas. O alerta é dado por Darcy Francisco dos Santos, especialista em finanças públicas do Estado. Ele diz que a utilização do que resta dos depósitos judiciais pode dar um fôlego em um mês ou outro e evitar parcelamento, mas que o problema não será resolvido no médio e longo prazos. Uma alternativa citada por Darcy, de enorme desgaste político, seria dilatar os reajustes dados aos servidores da segurança para além de 2018.
– O atual governo vem fazendo o que pode. Reduziu despesas e limitou reajustes a 3% no ano que vem. O problema é que o governo Tarso deu aumentos muito acima da capacidade do Estado pagar, alguns chegaram a 22%. A receita cresceu 6% – avalia.
A partir de 2016, o governo poderá contar com maior arrecadação caso consiga aprovar na Assembleia o aumento de ICMS, alternativa engendrada pelo Piratini para garantir estabilidade a médio prazo. A projeção é de que o remédio – amargo principalmente para a população mais pobre – eleve a receita anual em R$ 2 bilhões.
Enquanto não encontra alternativas, o parcelamento dos salários anunciado na última sexta-feira deve deprimir ainda mais a economia gaúcha, que já vem sofrendo o impacto da desaceleração brasileira. Com menos recursos, servidores devem cortar gastos e diminuir o consumo, minorando os ganhos do comércio e da indústria.
– Mais do que isso, a falta de transparência prejudica o PIB de 2016. Como o funcionalismo não sabe se vai receber em dia até o salário cair na conta, acaba puxando o freio de mão. A falta de confiança no futuro interfere na expectativa e impacta inclusive na economia no ano que vem – afirma Celso Pudwell, economista do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE).
Em caso de aprovação da elevação de impostos, os especialistas entendem que o enfraquecimento do ritmo do comércio deverá afetar a arrecadação do governo de forma comedida – boa parte da arrecadação do ICMS vem de três produtos que o usuário não consegue deixar de consumir: telecomunicações, energia elétrica e combustível.
*Colaborou Cadu Caldas
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