Presidente do TJ reclama de “desorganização” e falta de projeto no governo gaúcho

Desembargador José Aquino Flôres divulgou nota criticando Executivo. Foto: Guilherme Testa
Desembargador José Aquino Flôres divulgou nota criticando Executivo. Foto: Guilherme Testa

Em referência à lei estadual de responsabilidade fiscal e à falta de quorum para votar reajuste do Judiciário, José Aquino Flôres divulgou nota atacando ‘política de desvalorizar manancial humano’

Já próximo de deixar o cargo de presidente do Tribunal de Justiça do Estado, o desembargador José Aquino Flôres de Camargo emitiu mensagem com duras críticas ao governo do Estado. Mesmo sem citar o governador José Ivo Sartori, o desembargador atacou o comportamento do Executivo ao longo de 2015 e disse ver a “desorganização de um Estado sem projeto de crescimento econômico e social”.

Para Flôres, as políticas adotadas não foram boas à população, com a insistência “na política de desvalorizar seu manancial humano, justamente o maior patrimônio dos gaúchos”.

O presidente do TJ também criticou tanto as faltas de votações na Assembleia Legislativa por falta de quórum como a inclusão de projetos “envolvendo interesses comuns aos demais poderes” na pauta da convocação extraordinária dos deputados na próxima semana.

“O expediente político do regime de urgência para votação de projetos estruturantes do Estado pode indicar um perigoso caminho, porque viola regras da vida democrática, abreviando o devido processo legislativo e tangenciando o necessário debate público.”

No entender do desembargador, não ocorreu a melhor forma de relações entre os poderes ao longo do ano: “No plano constitucional, não houve violação à autonomia do Judiciário, mas relegou-se a plano secundário a recomendada harmonia das relações entre os Poderes de Estado”.

O desembargador se refere, sobretudo, à lei estadual de responsabilidade fiscal, que restringe o gasto com a folha de pessoal não só do Executivo, mas de todos os Poderes. Além disso, o governo ainda não liberou a base para votar o reajuste dos servidores do Judiciário em 2015, que repõe a inflação de 8,13%. O temor é de desgaste com o funcionalismo, que não teve aumento durante o ano em razão do decreto de contenção de despesas, que podem voltar a ser renovado no início de 2016.

MENSAGEM DO PRESIDENTE: O JUDICIÁRIO E OS PROJETOS LEGISLATIVOS

O ano de 2015 foi marcado pelo desafio de enfrentar a profunda crise financeira do Estado do Rio Grande do Sul. Dialogamos, de forma intensa, com a Sociedade. Noção de Estado e solidariedade não faltaram.

Mesmo diante da crescente desoneração do Tesouro operada pelo Judiciário nos últimos dez anos, optamos por deixar de executar parcela substancial do nosso orçamento no auxílio ao resgate da situação financeira do Estado e no desiderato de fechar as contas do Executivo. Nesta redução, priorizando a política de valorização do quadro funcional, deixamos imune das contenções o valor da quota orçamentária (R$ 69 milhões) destinado ao reajuste deferido aos servidores pelo Tribunal a contar de julho de 2015 e encaminhado à Assembleia Legislativa.

Contudo, após todo o esforço de contingenciamento feito pelo poder, lamentáveis manobras políticas, de forma sistemática, impediram o quorum para votação de qualquer dos projetos de valorização de nossos servidores em tramitação no Legislativo (além do reajuste, redefinição sobre o vale alimentação e a instituição da data base…).

Expediente que pode até ser legítimo, mas que, em nome da lealdade, não foi ajustado e veio a ser imposto, implicando, de forma oblíqua, obstrução à execução de verba do orçamento de pessoal do Judiciário, desviada que foi para atender interesses do Executivo. No plano constitucional, não houve violação à autonomia do Judiciário, mas relegou-se a plano secundário a recomendada harmonia das relações entre os Poderes de Estado.

Não bastasse isso, ao apagar das luzes do ano legislativo, sem diálogo, invocando, de forma duvidosa, a prerrogativa da convocação da Assembleia Legislativa em regime de urgência, vieram a ser incluídos na pauta mais de uma dezena de projetos pelo Executivo, vários deles polêmicos, entre os quais o da Lei de Responsabilidade Fiscal local, envolvendo interesses comuns aos demais poderes e que dizem com a essência da organização do serviço público.

O expediente político do regime de urgência para votação de projetos estruturantes do Estado pode indicar um perigoso caminho, porque viola regras da vida democrática, abreviando o devido processo legislativo e tangenciando o necessário debate público.

Nesse contexto de dificuldades, é necessário sublinhar a paradoxal estabilidade ostentada pelo Judiciário, que contrasta com a desorganização de um Estado sem projeto de crescimento econômico e social. E que, de forma subjacente, insiste na política de desvalorizar seu manancial humano, justamente o maior patrimônio dos gaúchos.

O conceito de paradigma nacional em termos de Justiça conferido ao Poder Judiciário Gaúcho é fruto da existência de um planejamento estratégico, baseado em uma política de valorização de seu quadro de pessoal, praticada por suas sucessivas gestões, responsável pelos invejáveis índices de produtividade e pelo reconhecimento da sua eficiência. Modelo este que não pode ser obstruído; ao contrário, mereceria ser seguido por outros segmentos da vida pública e, quiçá, por organizações privadas submetidas ao regime da competição.

Com efeito, a ética na vida política exige lealdade e transparência, abolindo práticas surradas, que nada combinam com a forma franca e direta que deve presidir as relações de Estado.

Fonte:Correio do Povo e Rádio Guaíba
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