Justiça obriga Estado a liberar dados fiscais sigilosos ao Ministério Público

piratiniPromotoria de Defesa do Patrimônio Público acusava Secretaria da Fazenda de manter “atos secretos”

A juíza da 7ª Vara da Fazenda Pública, Marilei Lacerda Menna, determinou a liberação de todos os dados fiscais pelo Estado do Rio Grande do Sul que venham a ser solicitados pelo Ministério Público Estadual. A Promotoria de Defesa do Patrimônio Público acusa a Secretaria da Fazenda de manter “atos secretos”, principalmente relativos a incentivos e isenções fiscais. Na decisão, a magistrada dá prazo de 20 dias para envio dos dados, sob pena de multa diária.

“…restou demonstrado nos autos que diante da dificuldade do Tribunal de Contas do Estado na obtenção dos documentos e informações acerca dos benefícios fiscais concedidos, com identificação e valores referentes a cada um dos beneficiados, o Ministério Público diligenciou administrativamente na obtenção dos dados, expedindo inclusive Recomendação a SEFAZ a fim de que fosse disponibilizado, todavia não obteve êxito. Desta feita, não restam dúvidas da plausibilidade das alegações suscitadas pelo Ministério Público, sendo imperioso o reconhecimento da liminar, nos termos em que foi postulado, haja vista a magnitude da situação, sendo relevantes os fundamentos”. 

Abaixo os dados que terão de ser liberados pela Secretaria da Fazenda, de acordo com a decisão judicial:

– Relação das sociedades empresariais agraciadas com benefícios fiscais e financeiros (este concedido sob a forma de créditos tributários futuros), com informação sobre os benefícios fiscais então vigentes, contendo a referida relação:
1) o CNPJ e a inscrição estadual das empresas;
2) o valor do benefício concedido;
3) em qual programa de fomento foi enquadrado; 
4) desde quando foi editado o benefício; até quando eventualmente retroagiu e quantas vezes foi prorrogado, com as respectivas datas de concessões, de publicação em Diário Oficial e de previsão de término; 
5) através de qual instrumento ou ato administrativo ele foi concedido; 
6) qual o respectivo cálculo individualizado de estimativa de impacto nas metas fiscais e correspondentes medida compensatória específica de que trata o artigo 14 da Lei Complementar 101/2000 (LRF); 
7) existência ou não, com a devida comprovação, de prévia autorização do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ); 
8) relação das empresas que se utilizaram do procedimento de prorrogação de prazo (parcelamento) para entrega dos respectivos arquivos, nos exercícios de 2010 a 2014 nos sistemas SINTEGRA e Escrituração Fiscal Digital ¿ EFD; 
9) relação nominal de omissos, relativamente à entrega dos arquivos SINTEGRA e EFD, no período de 2010 a 2014; 
10) listagem contemplado as 10 (dez) maiores devedoras de tributos no segmento de empresas que comercializam combustíveis, explicitando a situação dos débitos, bem como se usufruíram de benefícios fiscais nos últimos cinco anos, sua natureza e valor; 
11) relação de empresas do setor fumageiro que, nos últimos cinco anos tenham obtido benefícios fiscais, sua natureza e valor. b) todos dos documentos e vistorias comprobatórios de que as sociedades empresariais que receberam incentivos fiscais cumpriram os requisitos/contrapartidas previstos na legislação de regência; c) informe e comprove se fez constar nas Leis e Diretrizes Orçamentárias e Leis Orçamentárias dos últimos cinco anos, os valores dos impactos financeiros de todos os benefícios fiscais e financeiros, transformados em créditos tributários.

A Promotoria sustenta que as informações não podem ser mantidas em sigilo e que precisam ser “escrutinadas” pelo Ministério Público e Tribunal de Contas do Estado.

“A indevida invocação do sigilo, em verdade, faz com que haja atos administrativos verdadeiramente secretos sendo
praticados no Estado do Rio Grande do Sul! Em pleno século 21 e na vigência de um Estado Democrático de Direito, onde a transparência deveria ser radical em se tratando de recursos públicos”.

O Ministério Público quer esclarecer quais os critérios para a concessão dos incentivos fiscais. Para saber, por exemplo, se uma empresa que não poderia receber, recebe. Ou se uma empresa que poderia receber, não recebe e por qual razão. Conforme o promotor, a própria Procuradoria Geral do Estado já emitiu pareceres técnicos indicando que não cabe sigilo para o MP e TCE.

“Note-se que a Secretaria da Fazenda sobrepõe seu ‘entendimento jurídico’ à orientação técnica da própria PGE que, se não é a mais adequada, ainda assim deveria vincular os órgãos do Poder Executivo”.

Ministério Público de Contas

A procuradora substituta do Ministério Público de Contas, Daniela Wendt Toniazzo, lembra que o MPC vem tentando há anos buscar essas informações, mas nunca consegue.

“desde 2009 o Ministério Público de Contas tenta abrir essa ‘caixa-preta’ das receitas estaduais através de representações, recomendações, pareceres, mas sem sucesso. O sigilo fiscal, evidentemente, não se aplica aos órgãos de controle”

Lembra da importância de analisar esses dados.

“Num cenário de crise que estamos vivendo a fiscalização dessas receitas é imprescindível para que se saiba a extensão das isenções, de todas as arrecadações, dos benefícios que estão sendo dados”.

Associação do Ministério Público

O presidente da Associação do Ministério Público, Sérgio Harris, lembra que esses dados são ainda mais fundamentais no momento atual, já que o Estado vive uma grave crise financeira.

“Essa medida vem em boa hora e é fundamental para pensar o Rio Grande do Sul. O Governo do Estado RS mandou pacote com medidas duras para a Assembleia. Então nada mais justo e correto que tenhamos antes da votação pelos deputados a exata noção sobre os incentivos concedidos”.

Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul

O presidente da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul, Gilberto Scheffer, também reforça a importância da transparência no trato dos recursos públicos

“A sociedade precisa saber a quem se destina, quanto se destinou e especialmente quais são as contrapartidas e quais são os benefícios para a própria sociedade”.

O que diz a Secretaria da Fazenda

Antes mesmo da decisão, o subsecretário da Receita Estadual, Mário Wunderlich, afirmou que em caso de determinação judicial, os dados seriam fornecidos.

“Tem algumas informações dos negócios das empresas que entendemos não possa ser divulgadas. A decisão em sentido contrário será prontamente cumprida e os dados colocados à disposição”.

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