Luís Eduardo Gomes SUL21
O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), tomou posse nesta terça-feira (1º) como sucessor de José Ivo Sartori (MDB). À primeira vista, a linha política segue a mesma, com o foco no ajuste fiscal e no controle de gastos do Estado, o que colocou os funcionários públicos em uma situação de quatro anos de arrocho salarial e de salários parcelados. No entanto, a expectativa de entidades representativas de servidores públicos é que novo governador, ao contrário do antigo ocupante do Palácio Piratini, não os trate como inimigo número 1 no Rio Grande do Sul e abra as portas para o diálogo com as categorias, tanto em questões que dizem respeito a pautas sindicais, como para a construção de políticas públicas.
O Sul21 conversou nesta terça com representantes dos professores, de policiais civis e militares e de prefeitos para saber o que esperam da troca de governo e quais são as principais pautas que desejam ver atendidas entre 2019 e 2022.
Diálogo com os professores
Para a professora Helenir Aguiar Schürer, presidente do Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (CPERS), a política do governador Eduardo Leite seguirá a linha da privatização dos serviços públicos e da diminuição do tamanho do Estado. No entanto, ela espera, a partir até de declarações já dadas pelo tucano — no discurso de posse, ele se comprometeu a manter diálogo direto com os servidores –, é uma mudança na relação com o funcionalismo público.
“A gente espera que ele tenha vindo para negociar, para dialogar de forma respeitosa e que possamos realmente colocar à mesa os grandes problemas que temos na educação, passando principalmente pela valorização dos trabalhadores em educação, que hoje formam uma categoria adoecida, e que tenhamos um diálogo real, não um diálogo do surdo, em que nós buscamos o diálogo e o governo nunca nos respondeu ou realmente dialogou conosco”, diz Helenir.
De acordo com o CPERS, durante os seus quatro anos de mandato, Sartori se reuniu com a categoria apenas em uma oportunidade, no início de 2015. Posteriormente, os contatos foram todos feitos com os três nomes que passaram pela Secretaria de Educação ou com outras figuras do governo. Helenir avalia que o problema dessa relação é que muitos dos temas negociados não acabavam dando andamento porque o representante do governo envolvido nas reuniões não possuía o poder de decisão.
“Aquilo que a gente falava, nunca conseguimos levar a algum lugar porque não tinha ninguém com poder de decisão da mesa”, diz, acrescentando que esperam a presença de Leite nas negociações com a categoria.”Com o dono da caneta estando junto, a gente acredita que há mais credibilidade na negociação”.
O tucano se reuniu com o CPERS entre o primeiro e o segundo turno da eleição estadual. Helenir diz que, a partir do dia 7 de janeiro, quando o sindicato retoma as atividades, tentará agendar uma audiência com o agora governador empossado.
Promessas cumpridas
Para Aparício Santellano, presidente da Associação dos Sargentos, Subtenentes e Tenentes da Brigada Militar e Bombeiros Militares do Estado (ASSTBM), a principal expectativa da categoria é que as promessas de campanha sejam cumpridas. O governador Sartori, por exemplo, se elegeu em 2014 prometendo ampliar os efetivos das polícias, mas estes chegaram aos seus mais baixos patamares históricos, com o governador adiando a convocação de aprovados em concurso nos primeiros anos e realizando um novo concurso apenas em 2018. Entre as principais pautas que ele espera ver em uma mesa de negociação com o governo Leite estão a questão do plano de carreira da BM, o pagamento em dia dos salários e a criação de um cronograma para o preenchimento de vagas abertas na corporação.
A respeito da política de segurança pública, ele afirma que é preciso que o governo reconheça a necessidade de realização de investimentos na área. “Segurança pública é caro. Tem que valorizar o servidor e investir não só em viatura, tem que comprar colete novo, armamento adequado. Não pode o brigadiano enfrentar um bandido com um fuzil e ele com uma pistola. Também passa por uma série de medidas como a recomposição do efetivo. Não pode ter 20 bandidos e ter só um ou dois brigadianos na cidade”, diz.
A respeito dos nomes indicados por Leite para chefiar a área, Santellano avalia que tratam-se de “pessoas da área” com conhecimento das “demandas represadas”. O secretário de Segurança Pública será o vice-governador e delegado aposentado da Civil Ranolfo Vieira Júnior (PSDB). A delegada Nadine Anflor chefiará a PC e o coronel Ikeda comandará a BM. “Agora vai depender do governo como um todo dar carta branca para que possam ser executadas essas tarefas. Entender de segurança, eles entendem, tem que dar condições para desempenhar”, diz.
Enfrentamento ao ‘Novo Cangaço’
Fábio Castro, vice-presidente do Sindicato dos Escrivães, Inspetores e Investigadores da Policia Civil (Ugeirm), avalia que a categoria também espera uma mudança na forma de atuação do governo recentemente empossado na comparação com Sartori, especialmente no trato com os servidores, mas também em termos de política de segurança pública. “O que a gente espera, nesse primeiro momento, é que seja um governo voltado para o diálogo. A gente sabe que precisa ter um tempo para o governo se estruturar e implementar políticas públicas voltadas para a população e a gente quer participar do processo. A gente quer uma mudança em relação ao que foi o governo Sartori, que não se repita o que aconteceu da Assembleia Legislativa ser sitiada em ataque aos servidores públicos no momento que estavam se discutindo projetos que que diziam respeito à vida dos servidores e da população gaúcha”, diz.
Entre as principais demandas da categoria, ele elenca a necessidade de se solucionar a crise da superlotação de carceragens de delegacias — problema recorrente no governo Sartori –, o que, na avaliação da Ugeirm, precariza o trabalho dos policiais civis; a necessidade de aumento de efetivo, especialmente em delegacias no interior; e a adoção de uma política de segurança voltada para o combate aos crimes contra a vida, que tiveram forte aumento nos primeiros anos do governo Sartori — os dados de 2018, com tendência de queda, ainda não foram finalizados.
A respeito da falta de efetivo, a Ugeirm contabiliza que a Polícia Civil conta hoje com menos de 5 mil agentes, enquanto em 1996, período em que teria registrado seu maior efetivo, seriam 6,5 mil. Como consequência, ele diz que hoje há 104 delegacias no interior do Estado com apenas um servidor, o que gera uma situação que ele chamou de “Novo Cangaço”. “Um bando de bandidos tomam de assalto uma cidade, fortemente armados, a cidade passa a ser toda ela tomada como refém e usam cordões humanos para saquear bancos, especialmente”, diz.
Fábio cita o caso que ocorreu no início de dezembro, quando um gerente de banco foi morto em um assalto a uma agência no município de Ibiraiaras, localidade com menos de 7,5 mil habitantes e que não tem efetivo permanente da Brigada Militar. “É preciso estabelecer um processo de inteligência para combater e desarticular as quadrilhas, não esperar acontecer, porque corre o risco de perder vidas como aconteceu há pouco tempo, sem falar no trauma que isso causa”, afirma.
Previsibilidade para os municípios
Ao longo dos últimos anos, o principal pleito dos prefeitos gaúchos ante o governo do Estado foi a normalização dos repasses de recursos para a saúde. Ao fim de 2019, os municípios cobravam cerca de R$ 650 milhões em valores atrasados para a prestação de serviços, enquanto outros cerca de R$ 500 milhões eram cobrados por hospitais.
Para Antonio Cettolin (MDB), prefeito de Garibaldi e presidente da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), a principal pauta para o início do mandato de Leite é que sejam colocados em dia os valores referentes a repasses mensais na área da saúde. “A nossa luta sempre foi para que houvesse um repasse mensal, para que os municípios, através do seu planejamento e das suas ações voltadas para o atendimento da população, não tivesse interrupção. Então, de fato, entre todas as ações que o governador está propondo, para nós o principal é o pagamento em dia na parte da saúde”, avalia, acrescentando considerar positiva a fala da secretária de Saúde, Arita Bergmann, de que a prioridade é colocar em dia “a partir de janeiro”.
Uma segunda demanda que Cettolin considera prioritária são as obras de acesso asfáltico para 62 municípios que ainda não tem essa infraestrutura no Rio Grande do Sul, o que poderia incrementar as condições para o desenvolvimento dessas cidades. Cettolin diz que a Famurs não tem um cálculo de quanto custaria para dar o acesso asfáltico a essas 62 cidades porque trata-se de uma luta antiga e muitos dos orçamentos realizados no passado já estariam desatualizados, portanto não haveria um valor atualizado que se aproximasse da necessidade real de recursos para essas obras.