STF afasta obrigatoriedade de requerimento administrativo para isenção de IR por doença grave

O sistema constitucional brasileiro assegura, em seu artigo 5º, inciso XXXV, que nenhuma lesão ou ameaça a direito poderá ser excluída da apreciação do Poder Judiciário. Com base nessa cláusula pétrea, o Supremo Tribunal Federal tem desempenhado um papel importante na contenção de exigências processuais indevidas que comprometam o acesso à Justiça, sobretudo quando envolvem contribuintes em situação de vulnerabilidade.

Nesse cenário, destaca-se o recente, 28 de fevereiro de 2025, publicado em 5 de março de 2025, julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.525.407/CE, lavrado pelo ministro Luis Roberto Barroso, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.373), no qual o STF reafirmou sua jurisprudência no sentido de que não se exige o requerimento administrativo prévio para que se possa ingressar em juízo com pedido de isenção do imposto de renda por doença grave ou de repetição dos valores pagos indevidamente.

O caso e a questão jurídica

O caso teve origem no Ceará, onde uma turma recursal extinguiu processo judicial por entender que faltava interesse de agir, visto que o contribuinte não havia requerido administrativamente a isenção de IR prevista em lei. A justificativa era de que o Poder Judiciário não deveria ser acionado antes de esgotada a via administrativa, salvo em casos de manifesta resistência do Fisco.

O contribuinte, no entanto, recorreu ao STF alegando violação ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, sustentando que o direito à isenção decorre diretamente da lei e que o requerimento administrativo, nesses casos, não pode ser imposto como condição para o acesso ao Judiciário.

A fundamentação do STF

Relator do recurso, o ministro Luís Roberto Barroso reconheceu que, embora o Supremo já tenha admitido a necessidade de requerimento administrativo em certas hipóteses — como nos casos de benefícios previdenciários (Tema 350) —, essa exigência não se aplica ao direito à isenção de IR por doença grave, por tratar-se de direito subjetivo previsto em norma legal clara e objetiva. Com razão o ministro!

Ademais, a isenção do imposto de renda, quando vinculada ao diagnóstico de doença grave, é decorrência direta da lei, não havendo margem para juízo discricionário da administração. Logo, não há razão para obrigar o contribuinte a buscar primeiro a via administrativa antes de exercer seu direito de ação.

Além disso, o STF destacou que a exigência do requerimento administrativo, nesses casos, cria um obstáculo desnecessário ao contribuinte, especialmente considerando que se trata, muitas vezes, de pessoas em estado de saúde delicado, que não podem arcar com entraves burocráticos para ter seus direitos reconhecidos.

Vale dizer ainda, que a decisão — Tema 1.373 não deve ser confundida com a razão de decidir exarada no Tema 350 — RE 631.240 (necessidade do prévio requerimento administrativo para os benefícios previdenciários), pois não se aplica ao reconhecimento da isenção de imposto de renda, vez aqui não há relação jurídica em que a Administração atue como concessora de benefício, mas sim como exatora de um tributo que, diante da existência de doença grave, deixa de ser exigível por expressa determinação legal.

Trata-se, portanto, de um direito objetivo, cuja fruição independe de ato autorizativo, sendo suficiente a comprovação da condição ensejadora da isenção para que se configure a inexigibilidade do tributo. Assim, a tese do Tema 350 não se aplica, conforme reconhecido expressamente na decisão e em diversos precedentes citados (REs 1.504.556, 1.468.112, 1.400.571, 1.463.007, 1.420.011, entre outros).

A tese firmada

Portanto, com a decisão, o STF fixou a seguinte tese de repercussão geral: “O ajuizamento de ação para o reconhecimento de isenção de imposto de renda por doença grave e para a repetição do indébito tributário não exige prévio requerimento administrativo.”

E afim de não pairar duvidas sobre o tema, essa orientação é de observância obrigatória por todos os órgãos do Poder Judiciário e pela administração pública, e garante maior proteção aos direitos dos contribuintes em todo o país.

Conclusão

O julgamento do STF no RE 1.525.407/CE representa um avanço na concretização do direito fundamental de acesso à Justiça, protegendo o cidadão de exigências processuais desproporcionais e burocráticas. Ao afastar a necessidade de requerimento administrativo prévio para a isenção de imposto de renda por doença grave e para a repetição do indébito, a Corte reafirma seu compromisso com a justiça fiscal, a dignidade da pessoa humana e a simplicidade no exercício de direitos legalmente assegurados.

Trata-se de uma vitória relevante para os contribuintes, especialmente os mais vulneráveis, e de um passo importante na racionalização do sistema jurídico tributário brasileiro.

  • Gabriel Jotta Vazé advogado, especialista em Direito Previdenciário (LEGALE), pós-graduado em Previdenciário Empresarial (IEPREV), Planejamento Sucessório (CR Soluções), Créditos Fiscais (Aprimora) e Direito Bancário (FGV/RJ), diretor-adjunto da Diretoria Científica do IBDP (2024-2026), diretor jurídico da AMERJ (Associação dos Militares Oficiais Estaduais do Rio de Janeiro), presidente da Comissão de Direito Previdenciário da 1ª Subseção da OAB Nova Iguaçu/RJ (2025-2027), conferencista e palestrante.

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