A falácia do fortalecimento da segurança: Governos ignoram Policias Militares e investem em “Meias Polícias”.

Em um movimento que expõe as contradições e a superficialidade das políticas de segurança pública no Brasil, o governo federal anunciou o programa “Município Mais Seguro”, que injetará R$ 65 milhões em guardas municipais por todo o país. O anúncio, que inclui a compra de equipamentos e a capacitação de agentes, ocorre em um momento crítico, enquanto a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 18/2025 avança no Congresso com o apoio de uma base política que, paradoxalmente, se diz defensora das Polícias Militares.Esta iniciativa, longe de representar um avanço, aprofunda um erro histórico e perpetua a ineficiência estrutural que assola a segurança pública brasileira. Ao fortalecer as guardas municipais e lhes conferir atribuições de policiamento ostensivo, o governo e o Congresso Nacional optam por criar mais uma “meia polícia”, em vez de solucionar o problema central que nos torna uma anomalia no cenário mundial: a ausência do ciclo completo de polícia para as Polícias Militares.

Brasil: A Exceção Mundial que Custa Vidas
O Brasil é, hoje, o único país do mundo que insiste em um modelo policial fragmentado, onde uma força (a Polícia Militar) inicia a ocorrência e outra (a Polícia Civil) a conclui. Como aponta o coronel da Polícia Militar de Santa Catarina, Marlon Jorge Teza, “até alguns anos atrás, havia três países em que as polícias não tinham ciclo completo: Guiné-Bissau, Cabo Verde e Brasil. Atualmente é só o Brasil” [1].Essa dualidade, como define o especialista Luís Flávio Sapori, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, “tornou-se foco crônico de ineficiência na atuação do Estado na provisão da segurança pública no Brasil” [2]. A consequência direta é a descontinuidade investigativa, a perda de informações cruciais e, por fim, os baixíssimos índices de elucidação de crimes, que em muitos casos, como homicídios, superam a marca de 60% de impunidade [3]. A Polícia Militar, que está na linha de frente e detém o conhecimento primário do fato criminoso, é legalmente impedida de investigar, enquanto a Polícia Civil é obrigada a trabalhar com informações de segunda mão, em um processo que o próprio coronel Teza descreve de forma contundente: “As duas polícias são pela metade: a Polícia Civil termina o que não começou, e a Polícia Militar não termina o que começou” [1].

A Falácia do Discurso Político
O mais alarmante é o apoio declarado à PEC 18/2025 por parte de deputados federais ligados às próprias Polícias Militares e por partidos como o PL, Republicanos e PP, que historicamente se posicionam como defensores da categoria. Este apoio desmascara a retórica e revela que, na prática, as ações desses grupos políticos contribuem para o enfraquecimento e a desvalorização das instituições que dizem proteger.O discurso de valorização das polícias se mostra vazio quando, no momento decisivo de uma reforma constitucional, a escolha é por aprofundar a fragmentação, criar novas disputas de competência e negar às Polícias Militares a ferramenta mais essencial para a eficiência policial: o ciclo completo. A luta pela segurança pública não se faz com discursos, mas com reformas estruturais corajosas.Continuar a negar o ciclo completo de polícia às Polícias Militares e, ao mesmo tempo, desviar recursos e competências para novas forças é uma política fadada ao fracasso. É uma falácia que não apenas desrespeita os mais de 400 mil policiais militares do Brasil, mas também condena a sociedade a conviver com a ineficiência e a impunidade. A verdadeira modernização da segurança pública passa, inevitavelmente, por transformar a Polícia Militar em uma polícia completa, como ocorre em todo o mundo desenvolvido.

Referências[1] Gazeta do Povo. (2021, 14 de agosto). Ciclo completo de polícia: por que o Brasil é a exceção mundial na adoção da medida? Acessado em 21 de outubro de 2025, de https://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/ciclo-completo-de-policia-por-que-o-brasil-e-a-excecao-mundial-na-adocao-da-medida/ [2] ASSTBM. (2025, 15 de outubro). Análise da PEC 18/2025: prejuízos para as PMs e proposta de inclusão do ciclo completo de polícia. Acessado em 21 de outubro de 2025, de https://asstbm.org.br/2025/10/analise-da-pec-18-2025-prejuizos-para-as-pms-e-proposta-de-inclusao-do-ciclo-completo-de-policia/ [3] G1. (2024, 11 de novembro). Levantamento mostra que 6 em cada 10 homicídios ficam sem solução no Brasil. Acessado em 21 de outubro de 2025, de https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2024/11/11/levantamento-mostra-que-6-em-cada-10-homicidios-ficam-sem-solucao-no-brasil.ghtml

A Direção
ASSTBM

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