Sem recurso municipal, BM admite que policiais não serão obrigados a residir em seus núcleos
Apesar de a prefeitura de Caxias do Sul ter voltado atrás e afirmado que vai manter o pagamento do auxílio-moradia aos brigadianos caso o “Estado não tenha condições de cumprir sua obrigação”, há incertezas sobre a forma como o policiamento comunitário continuará funcionando na cidade. No entendimento da prefeitura, pagar o auxílio é uma obrigação do Estado por este ser o administrador da Brigada Militar e ter o dever de garantir a segurança pública. Para a BM, pagar o auxílio é uma opção do município para manter o policial mais perto do bairro.
O comandante do 12º Batalhão de Polícia Militar (12º BPM), o major Jorge Emerson Ribas acredita que o debate é marcado por uma uma má interpretação sobre o programa:
— Alguns tem a impressão que depende do auxílio-moradia. Claro que é uma garantia e é importante para esta aproximação (com os bairros), mas o programa independe (do auxílio). Tudo indica que (o convênio), muito provavelmente, não será renovado. Mas a população pode ter certeza que o programa vai ter continuidade.
O comandante-geral da Brigada Militar, coronel Andreis Silvio Dal’Lago, também garante que o policiamento seguirá funcionando em Caxias, embora não explique como. De acordo com ele, a participação municipal no policiamento comunitário é de apenas 5% do valor total.
Pelo convênio, que é feito em dezenas de cidades gaúchas, o Estado oferece os PMs, as viaturas e demais equipamentos e, em contrapartida, as prefeituras interessadas custeiam o auxílio-moradia para que os policiais participantes morem nos bairros do núcleo onde atuam. Ou seja, é o recurso municipal que possibilita que o policial militar fique mais próximo e envolvido com a comunidade em que trabalha. Este é considerado um ponto chave da atuação preventiva.
Para custear o auxílio, a prefeitura também fez uma contraproposta, que envolve relatórios de produtividade e prestação de contas mais frequente, entre outros itens (leia abaixo). A Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP) ainda não se manifestou oficialmente sobre a proposta.
Sem o auxílio-moradia, a tendência é que não seja mais obrigatório ao policial morar no bairro de seu núcleo de atuação. Esta é, inclusive, a orientação dada aos brigadianos diante dos impasses sobre a renovação do convênio com a prefeitura. O Comando-Geral da BM garante que o modelo de atuação não mudará, mas ainda estuda a melhor forma de incentivar os brigadianos a continuarem em seus núcleos.
Outra preocupação é que o debate entre prefeitura e governo estadual não seja concluído em tempo, pois o primeiro convênio, que beneficia metade do efetivo comunitário — ou seja, 36 PMs —, termina em meados de setembro. Os outros dois têm prazos maiores (início de 2018 e final de 2018). Assim, os 36 brigadianos restantes continuarão morando em seus núcleos até as datas estipuladas.
CLÁUSULAS DE FISCALIZAÇÃO PROPOSTAS
:: Que as viaturas utilizadas no programa tenham o adesivo “Policiamento Comunitário” nas laterais e na parte traseira.
:: Comprovante ou declaração de residência do servidor vinculado ao policiamento comunitário.
:: Declaração individual da atuação do PM efetivamente no programa emitido pelo respectivo comandante da unidade.
:: Declaração mensal do servidor vinculado de recebimento do auxílio-moradia.
:: Relatório do GPS (sistema de localização por satélite) constando o itinerário de cada viatura empregada no policiamento comunitário.
:: Apresentar até o 10º dia útil de cada mês o relatório de atividades, pré-elaborado, do PM designado para o programa. O documento deve conter as ocorrências atendidas, locais visitados, os contatos com lideranças e moradores (com nome e endereço) e itinerário das rondas realizadas.
:: Encaminhar até o 10º dia útil de cada mês os resultados obtidos com o policiamento comunitário, apresentando indicadores criminais de cada núcleo.
:: Encaminhar até o 10º dia útil de cada mês a prestação de contas ao município (antes a prestação era feita só no final do convênio).
Entrevistas
“O programa é da BM e do Estado e continuará existindo”, garante comandante-geral
Coronel Andreis garante que impasse na renovação não prejudicará atuação nos bairros
Apesar do impasse sobre o convênio entre prefeitura e governo estadual, o comandante-geral da Brigada Militar (BM), coronel Andreis Silvio Dal’Lago, garante a continuidade do policiamento comunitário em Caxias do Sul. No entanto, o oficial admite que reajustes são necessários e não confirma se PMs continuarão nos bairros. O coronel ressalta que o projeto é da BM e que a participação municipal é de apenas 5% do valor total.
Pioneiro: Há a possibilidade de o Estado assumir o policiamento comunitário como a prefeitura sugere?
Coronel Andreis Silvio Dal’Lago: É necessário esclarecer algumas coisas. A polícia comunitária é uma estratégia da corporação e é realizada de várias formas, sendo uma delas nestes núcleos citados em Caxias do Sul. Este modelo foi implementado a partir da articulação de parcerias entre a BM, as prefeituras que desejarem participar e a sociedade organizada — como é o Consepro. No entanto, a responsabilidade é da BM e o programa ocorre por todo Estado. Nestes convênios, em que a prefeitura auxilia com a bolsa-moradia, a participação municipal é 5% do valor total. O custo para a BM, entre potencial humano, treinamento e equipamento, contempla os outros 95%. Então, o governo estadual tem de assumir (o programa)? Não. O programa é da BM e concedemos às prefeituras a possibilidade de fazer a parceria que resulta na bolsa-moradia. O nosso desejo é somar energias para multiplicar efetividade para com a comunidade. Se a prefeitura não desejar mais participar, ou seja, decidir deixar de pagar este auxílio, respeitaremos. E iremos continuar realizando o policiamento comunitário. Se ocorrer (a não renovação do convênio), lamento muito, principalmente por Caxias do Sul ser uma cidade próspera e modelo para todo o Estado.
A BM pode oferecer um incentivo para que os PMs morem nas comunidades de seus núcleos?
Acredito que muitos policiais já estão morando em residências próprias. Sem este auxílio, podemos articular com as forças vivas da comunidade e estabelecer outras parcerias. Queremos manter o princípio da proximidade, e isto inclui o brigadiano morar no bairro. Se preciso, iremos rearticular o policiamento comunitário em Caxias. Quero deixar claro que queremos ampliar parcerias, mas já bancamos o projeto. Esta fala de que “o governo estadual tem que assumir” está equivocada. O programa é da BM e do Estado e continuará existindo.
As propostas de alteração visando uma fiscalização maior do programa podem ser aceitas?
A participação da prefeitura é de 5%, desta forma o limite de intervenção é proporcional a estes 5%. Se a prefeitura tem alguma clausula para ajustar, estamos dispostos a ouvir e mediar. Só que a prefeitura não administra e não controla o programa. A prefeitura não tem esta competência, até pelo investimento que é feito. O numerário é referente ao bolsa-moradia, então, realmente, a prefeitura tem que buscar formas de ter certeza que está sendo utilizado em moradias (no bairro designado).
O programa pode continuar sem a obrigação dos policiais morarem nas comunidades?
A bolsa-moradia é um complemento motivador e positivo. Se o policial não morar ali, vai morar em um bairro vizinho. Iremos reajustar, talvez fazer substituições, mas vamos manter o serviço na qualidade que temos hoje. A BM tem a própria legislação que regula (incentivos), como horas extras ou outro implemento para motivar o PM. Mas o auxílio-moradia é mediante convênio com prefeitura ou outro órgão.
“Queremos que o Estado dê prosseguimento, mas assumindo tudo”, diz secretário
Secretário Mallmann ressalta necessidade da prefeitura investir na Guarda Municipal
A prefeitura de Caxias do Sul voltou atrás e afirma que vai manter o pagamento do auxílio-moradia aos brigadianos caso o “Estado não tenha condições de cumprir sua obrigação”. No entanto, ainda há incertezas sobre a forma como o policiamento comunitário continuará funcionando na cidade. Para custear o auxílio, a prefeitura também fez uma contraproposta, que envolve relatórios de produtividade e prestação de contas mais frequente, entre outros itens. A Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP) ainda não se manifestou oficialmente sobre a proposta.
Pioneiro: O que são estas alterações propostas no convênio do policiamento comunitário?
Secretário José Francisco Mallmann: Caso o Estado não tenha condições (de assumir o auxílio-moradia), serão as regras de controle e fiscalização que vamos colocar, o que, até então, não existia. São questões plausíveis. Esta é uma verba do município disponibilizada ao estado. Tenho de saber se está sendo bem empregada porque posso ser responsabilizado por improbidade administrativa. São dados que a BM irá nos informar. Estamos na expectativa que o Estado assuma (o auxílio-moradia) e, este dinheiro, possa ser investido na Guarda Municipal. Com todo este recurso, em pouco tempo teremos uma guarda bem empregada e com efetivo.
É um convênio, mas o município não quer mais oferecer a contrapartida?
Não queremos dar este auxílio-moradia. É possível (que o convênio continue sem o repasse do município). Tanto que vai ser marcada uma agenda com o secretário de Segurança Pública (Cézar Schirmer). Nada impede que o Estado continue o policiamento comunitário.
Se não forem aceitas as exigências, o policiamento comunitário no formato atual pode acabar?
Neste caso, teremos de nos reunir com a governança e estabelecer qual será a decisão. Mas o secretário adjunto (estadual, Coronel Everton Oltramari) foi muito claro em dizer que este é um programa do Estado. Deixou muito claro que, se por acaso o município não queira mais, eles vão manter. Certamente irão dar um “plus” para aqueles policiais comunitários. Eu acredito nisso.
É uma possibilidade o policiamento comunitário continuar sem a obrigação dos PMs morarem nos bairros do seu núcleo?
Não acredito nisso. O Estado pode adotar outros mecanismos. É uma questão de gestão. Na reunião com o secretário (Schirmer), irei afirmar que o município, devido a sua situação financeira, quer que o Estado dê prosseguimento ao policiamento comunitário, mas assumindo tudo. O município tem que investir na sua Guarda. Caxias do Sul tem o segundo PIB gaúcho e tem que ter uma Guarda Municipal a altura. É o plano de dobrar o efetivo em seis anos?Será uma outra Guarda, totalmente diferente da atual. Um guarda municipal é do município e não sai do município. Diferentemente da BM, em que um policial pode ser deslocado do bairro para atender situações de emergência em cidades próximas. Eles também podem ir para a Operação Golfinho ou compor a Força Nacional de Segurança Público. Já o guarda municipal fica dentro do município. Ele mora e permanece, a sociedade conhece ele.
Um guarda municipal terá o mesmo papel que um policial militar, então?
Não. A BM faz sua parte e está na Constituição. É um policiamento ostensivo e preventivo. A guarda tem suas atribuições e competências estabelecidos pela Lei 13.022. Mas o artigo 301 do Código de Processo Penal é muito claro: qualquer do povo pode e as autoridades policiais devem prender quem está em flagrante delito. Se qualquer do povo pode, muito mais um agente público. Se um guarda municipal estiver frente a um flagrante delito, ele vai prender aquela pessoa e encaminhar para a autoridade policial como faz um brigadiano. A Guarda Municipal pode fazer a prevenção primária da criminalidade. E é o que estamos fazendo. A Operação Largo da Estação é uma força-tarefa em que a BM está incluída, mas há muito tempo não participa. A Guarda Municipal está sozinha e está mantendo a lei e a ordem. Nunca mais deu problema lá.