Câmara aprova PL Antifacção, entenda o que muda com a nova norma

O presidente Hugo Motta impediu a apresentação dos destaques do Partido Liberal que incluíam no PL Antifacção a equiparação das facções aos grupos terroristas

BRASÍLIA – A Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei (PL) Antifacção em sessão nesta terça-feira (18/11) diante de pressão do presidente Hugo Motta (Republicanos-PB) para acelerar a votação. A proposta, relatada pelo deputado federal Guilherme Derrite (PP-SP), recebeu 370 votos diante de 110 contrários.

Grande parte dos votos contrários à proposta partiram do PT e de aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ainda que o PL Antifacção seja de autoria do governo Lula, o grupo rejeitou as modificações feitas por Guilherme Derrite em seu substitutivo. O relator até incorporou trechos da proposição original, mas propôs alterações que a base não aceitou.

Uma delas é a divisão de bens e valores recolhidos em operações contra as facções entre os fundos da Segurança Pública — destinado à Polícia Federal (PF) — e dos estados. A avaliação do Planalto é que a divisão diminui o volume de recursos destinados à PF.

Foram os partidos de oposição e de centro que patrocinaram a aprovação do PL Antifacção segundo o substitutivo de Guilherme Derrite. A oposição capitaneada pelo Partido Liberal até pretendia mudar o relatório. A intenção era acrescentar no PL Antifacção a equiparação das facções aos grupos terroristas para garantir que os criminosos recebessem o tratamento dado aos extremistas no âmbito da Lei Antiterrorismo.

Quem barrou a mudança, antes que ela fosse sugerida no plenário, foi o próprio presidente Hugo Motta. Ele temia que a mudança tornasse o texto inconstitucional, permitindo que o Supremo Tribunal Federal (STF) pudesse derrubá-lo.

O único destaque aprovado pelos deputados após a aprovação do texto-base no plenário foi o apresentado pelo líder do Novo, Marcel Van Hattem (Novo-RS). Ele proíbe os presos de votar nas eleições, ainda que estejam detidos em caráter provisório.

A oposição defendeu ativamente essa emenda, que, aprovada, agora passa a constar no PL Antifacção — e contempla todos os presos, sem restrições. O PT criticou o destaque, mas, votou a favor. O líder do partido, Lindbergh Farias (PT-RJ), disse que a bancada votou pela aprovação mesmo sabendo que essa proibição é inconstitucional.

O PL Antifacção segue para análise do Senado Federal. Ali, o presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), antecipou que o senador Alessandro Vieira (MDB-SE) assumirá como relator.

O que é o PL Antifacção?

Originalmente, o PL Antifacção previa mudanças na Lei das Organizações Criminosas. Desde o início, Derrite defendia que não era o suficiente, e que essa legislação não conseguia contemplar os crimes cometidos pelas facções. No primeiro relatório, ele equiparava as facções aos grupos terroristas, atendendo à principal reivindicação da oposição. Essa alteração previa uma mudança na Lei Antiterrorismo para garantir que as facções fossem tratadas no escopo dela. 

A mudança de Derrite não deu certo e ele recuou após alegações de que isto comprometeria a atuação da Polícia Federal (PF) no combate ao crime. A última versão do parecer foi protocolada na Câmara após o início da sessão desta terça-feira. Nela, o relator propõe a criação do Marco Legal de Combate ao Crime Organizado, nome que o próprio presidente da Câmara escolheu.

Agora, Derrite não mexe mais nas leis existentes. Ele propõe a criação de uma lei nova, inteiramente dedicada às facções e às milícias. Mas o relator não chama as facções de “facções”. Ele as classifica como organizações criminosas ultraviolentas.

No Marco Legal que propõe, Derrite define penas de prisão entre 20 e 40 anos para membros de facções e milícias que cometerem os crimes de domínio social listados nessa lei. Ele ainda aumenta penas para aqueles que usarem drones nas ações das facções.

Os delitos contemplados nesse trecho são aqueles que acontecem, por exemplo, quando as facções e milícias dominam favelas impedindo a entrada das forças de segurança; ou quando cobram pela prestação de serviços ilegais — um exemplo é o gatonet.

Esses crimes receberão, pelo projeto, tratamento semelhante àqueles considerados hediondos. Na prática, significa que quem for enquadrado pelo Marco Legal não terá direito à anistia, graça ou indulto. Também não poderá pagar fiança e nem ter direito ao livramento condicional.

Em seu substitutivo, Derrite mantém pontos do PL Antifacção apresentado pelo Ministério da Justiça. O principal deles é o sufocamento financeiro das facções. Ele também aderiu à sugestão do governo de criar um banco nacional de membros de facções para permitir que os estados possam trocar informações sobre esses criminosos. 

A última versão do relatório era costurada pelo relator desde quarta-feira (12/11), quando seu quarto substitutivo não alcançou o consenso necessário para ser votado no plenário da Câmara. A despeito de ter feito mudanças, Derrite ignorou a principal crítica — e reivindicação — da base. 

Ele manteve a previsão de distribuição dos bens recolhidos em operações contra facções entre a PF e os fundos de segurança estaduais. O único ajuste feito pelo relator nesse ponto é a previsão de que os valores destinados à PF vão para o Fundo Nacional de Segurança Pública, e não mais para o Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-Fim da Polícia Federal (Funapol).

Derrite, em crítica direta à base, afirmou no relatório que integrantes do governo Lula não o procuraram. “Tomei conhecimento pela mídia de alguns pontos que não agradavam”, expôs, acrescentando que acolheu o pedido da equipe do presidente da República sobre o perdimento de bens. 

O relator incorporou no substitutivo ao PL Antifacção a previsão de perdimento automático de bens ainda durante o inquérito policial. Na prática, significa que a Justiça poderá impôr a perda imediata de bens e valores recolhidos de facções e milícias. A previsão é que esses itens passem imediatamente a pertencer ao Estado.

O deputado também acata outras sugestões nesse último parecer. São ajustes técnicos, como: 

  • Mudança na lei de lavagem de capitais para prever que o produto ou proveito do crime seja revertido em favor do ente federativo responsável pela investigação; é nesse ponto que ele mantém a divisão dos bens apreendidos entre os fundos estaduais e o fundo de Segurança Pública.
  • Participação do Ministério Público através dos Procedimentos Investigatórios Criminais do MP quando houver força-tarefa para investigação de facções;

Há, ainda, um ajuste que acolhe um pedido da base em relação à Receita Federal. O substitutivo de Derrite prevê que as medidas previstas no PL Antifacção não impedem retenção, apreensão e perdimentos de bens, valores e ativos previstos em normativos internos aplicados no âmbito do processo administrativo.

“O que permite que Receita Federal, Banco Central e outros órgãos fiscalizadores possam continuar executando suas medidas de perdimento imediato de bens”, esclareceu no relatório.

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