Estimativa baseada na arrecadação mostra que quase todos os funcionários terão vencimento parcelado no dia 31. Piratini ainda aguarda receita para definir pagamento
Elaboradas com base em dados oficiais, projeções indicam que os servidores públicos do Executivo do Estado deverão receber em torno de R$ 620 por matrícula no próximo contracheque, a ser pago na segunda-feira. Na prática, isso significa que os salários de quase todo o funcionalismo serão parcelados – em 31 de julho, o fatiamento atingiu 47,2% do quadro.
Oficialmente, o valor segue indefinido porque o Palácio Piratini ainda não sabe precisar quanto, de fato, entrará em caixa até sexta-feira. O governo contará somente com esse dinheiro para honrar o compromisso, a menos que encontre uma saída de emergência. Não há mais tempo hábil para apresentar o projeto de lei que amplia o uso dos depósitos judiciais (recursos de terceiros em litígio na Justiça).
Em julho, faltaram R$ 360 milhões para quitar as remunerações. A solução encontrada foi depositar R$ 2.150 por matrícula no último dia do mês e complementar o valor pendente em 11 de agosto, deixando para trás o pagamento da dívida com União. A estratégia resultou no bloqueio das contas do Estado, que perdurou até quinta-feira passada. Desde então, a Secretaria da Fazenda vem fazendo malabarismos para colocar os compromissos em dia.
– Até agora, praticamente todos os recursos arrecadados no mês foram usados para pagar atrasos, mas muitas contas continuam pendentes e vão permanecer assim por mais um bom tempo – diz o especialista em finanças públicas Darcy Carvalho dos Santos.
Nesta quinta, os cofres estaduais receberão a segunda etapa do ICMS recolhido sobre combustíveis, energia elétrica e telecomunicações, cujo valor será totalmente drenado para a folha. A Fazenda não divulga a estimativa de receita, mas, com base em números do Portal Transparência RS e da arrecadação no mesmo período de 2014, é possível estimar o que vem pela frente.
A tendência é de que o Estado consiga acumular pelo menos R$ 505 milhões até segunda-feira. Caso se confirme, o saldo ainda cairá para R$ 215 milhões, já que o Piratini é obrigado a repassar R$ 290 milhões aos demais poderes.
Chamado de duodécimo, esse repasse é feito conforme o orçamento previsto para o ano (para pagar folha e custeio), e não com base na arrecadação de cada mês. Nos bastidores, integrantes do governo têm afirmado que estaria em negociação, com o Judiciário, a possibilidade de redução do valor. A informação é contestada por membros do Tribunal de Justiça.
Em entrevista na última quinta-feira, sem entrar em detalhes, o governador José Ivo Sartori disse que “10 ou 12 pontos” estão em tratativas para amenizar a crise. Isso explicaria, segundo ele, a demora para apresentar a proposta que amplia o uso dos depósitos judiciais para 95% do saldo – iniciativa que, de uma só vez, injetaria R$ 1 bilhão no Tesouro, evitando o parcelamento salarial. A lentidão é motivo de críticas entre a oposição e os servidores.
Um mês sob tensão
31 de julho
O governo do Estado paga salários do funcionalismo até R$ 2.150 e parcela o restante, provocando paralisação.
10 de agosto
Piratini decide terminar de pagar a folha de julho, em detrimento da dívida com a União, protelada desde o dia 31.
11 de agosto
União bloqueia contas até sequestrar o valor correspondente à parcela pendente (R$ 263,9 milhões).
20 de agosto
Cai bloqueio da União. Piratini retoma o controle sobre contas e começa a pagar pendências de julho.
31 de agosto
Se nenhuma receita extraordinária surgir de última hora, o Piratini irá parcelar novamente o pagamento da folha.
Greve prevista pode avançar, diz sindicalista
A possibilidade de receber menos de um salário mínimo (hoje em R$ 788) na próxima segunda-feira mexe com os brios de quem trabalha nas dependências estaduais. Presidente do Sindicato dos Servidores Públicos do Estado (Sindisepe), Claudio Augustin reafirma: assim que se confirmar o cenário, o funcionalismo vai cumprir o prometido e paralisar as atividades até quinta-feira. Mas o prazo pode aumentar.
– O governo insiste em jogar a culpa da sua incapacidade política nas costas dos servidores, e isso está errado. Dependendo do que acontecer, vamos rediscutir a situação e avaliar a possibilidade de estender a paralisação – afirma Augustin.
O cenário pode se agravar ainda mais se a União decidir bloquear as contas do Estado nos primeiros dias de setembro. Até agosto, o governo federal vinha esperando 10 dias para aplicar as sanções previstas no contrato, o que dava fôlego ao Piratini.
Desta vez, a parcela da dívida (que deveria ser paga na segunda-feira, juntamente com os salários do funcionalismo) será novamente protelada para priorizar a folha. Se o bloqueio das contas for aplicado na terça-feira, a Secretaria da Fazenda ficará paralisada. Não poderá fazer nenhuma movimentação financeira até que o valor devido seja sequestrado, o que pode demorar dias. Com isso, o restante das parcelas salariais deverá levar mais tempo para ser quitado.
Ministro é convidado a falar sobre bloqueios
A situação financeira de Estados como o Rio Grande do Sul levou o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, a ser convidado para explicar, na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara, a opção pelo bloqueio das contas.
Outro agravante para a crise é o atraso no repasse do Fundo de Exportação por parte da União. Ao todo, o Estado tem R$ 118 milhões a receber, o que aumentaria em R$ 340 o valor a ser pago por matrícula na segunda-feira.
A verba vem sendo cobrada desde o início do governo, mas não chegará de uma só vez. Deverá ser paga em quatro parcelas, de setembro a dezembro. A data ainda não está definida.
ZERO HORA